Geração de jovens que quer beber menos impulsiona mercado de cervejas sem álcool

Se a britânica Becky Kean quiser algum dia organizar uma festa com álcool em sua cervejaria, ela vai ter que comprar bebidas em algum outro lugar. Isso porque a empresa da jovem, a Nirvana Brewery, localizada em Londres, só produz cervejas sem álcool.

No cardápio há sete tipos deferentes da bebida, de pale ale a stout, até uma com chá verde. Nenhuma delas, entretanto, capaz de deixar os clientes bêbados.

Um década atrás, bares como o Nirvana talvez fossem incompreendidos ou ridicularizados. Sim, a cerveja sem álcool existe há bastante tempo – uma das pioneiras, a Kaliber, da cervejaria Guinness, foi lançada em 1986 -, mas costumavam vender pouco e, por isso, não chegavam a ganhar destaque no portfólio das marcas.

Em geral, elas eram do estilo pale lager, de um dourado pálido, e não muito agradáveis ao paladar dos bebedores – que quase sempre se restringiam ao motorista da rodada ou a grávidas.

Mas tudo isso mudou nos últimos anos, diante de um aumento expressivo no volume de cervejarias artesanais dos dois lados do Atlântico e do crescimento no número de pessoas que decidem beber menos ou eliminar completamente o álcool da vida.

Essa combinação permitiu que se multiplicassem nos últimos anos os rótulos de cervejas com baixo teor alcoólico ou sem álcool de diferentes estilos.

A tendência aparece nos indicadores de vendas. Segundo a consultoria britânica CGA, o comércio de cervejas com baixo teor alcoólico ou sem álcool no Reino Unido avançou 28% em volume nos 12 meses até fevereiro deste ano, na comparação com os 12 meses imediatamente anteriores.

A Alemanha também vive momento parecido, onde, de acordo com a Associação Alemã de Produtores de Cerveja (DBB), uma em cada 15 cervejas vendidas hoje no país não tem álcool.

Não surpreende, portanto, que uma quantidade cada vez maior de cervejarias artesanais como a Nirvana venha optando por produzir apenas cervejas sem álcool ou com baixo teor alcoólico.”Abrimos o negócio em 2017 e já estamos fabricando perto de meio milhão de garrafas por ano”, diz Becky, de 29 anos.

“Há pouco tempo começamos a exportar para a Escandinávia e para a Suíça e estamos de olho nos mercados da Ásia e da América do Sul.”

A jovem conta que o pai é alcoólatra em recuperação – e ela queria que ele também pudesse frequentar seu bar e beber uma boa cerveja. “Pra muitas cervejarias a bebida sem álcool é algo complementar, que vem depois, mas nós queríamos que este fosse nosso único foco.”

Mas o que é exatamente uma cerveja sem álcool? A pergunta pode soar estúpida, mas no Reino Unido ela não tem uma resposta tão óbvia – é preciso olhar para dois percentuais que parecem semelhantes, mas são bem diferentes.

Em boa parte da União Europeia e nos Estados Unidos, uma cerveja é considerada sem álcool quando tem teor alcoólico igual ou menor que 0,5%.

Já no Reino Unido, esse percentual limite é menor, de 0,05%. Lá, uma cerveja com 0,5% de álcool só pode ser chamada de “desalcoolizada”. Como a terminologia não é das mais simpáticas, a maior parte das cervejarias britânicas opta por classificar as bebidas como “de baixo teor alcoólico”.

As cervejas estrangeiras com teor alcoólico entre 0,05% e 0,5%, entretanto, podem sem vendidas como “sem álcool” no Reino Unido – elas não precisam adaptar o rótulo às normas locais.

“Um sujeito não consegue ficar bêbado com uma cerveja com 0,5% de álcool não importa o quanto ele beba”, diz Rob Fink, cofundador da Big Drop Brewing Company.

“Para você ter uma ideia, uma banana madura ou uma fatia de pão podem conter 0,5% de álcool.”

“Isso é importante, porque é possível fazer cerveja de excelente qualidade com um teor alcoólico de 0,5%, mas é bem mais difícil fazer o mesmo com teor alcoólico de 0,05% – é preciso arrancar o álcool quase que completamente, o que acaba comprometendo muito do sabor”, afirma o produtor.

Também baseada em Londres, a cervejaria de Fink só produz cervejas com baixo teor ou sem álcool – e exporta 40% da produção para Noruega, Dinamarca, Finlândia, Suécia e Canadá.

Comparada à europeia, a indústria mundial de cerveja sem álcool ainda está engatinhando, diz Bill Shufelt, um dos fundadores da cervejaria americana Athletic Brewing. Mas está expandindo rápido.

Quando montou sua empresa em Connecticut em 2017 com a proposta de produzir apenas bebida sem álcool, o cervejeiro ouviu de muita gente que estava louco. “As pessoas faziam piada – mas isso sempre mudava quando elas experimentavam nossas cervejas.”

A Athletic vende hoje seus produtos em todo o país e recentemente começou a exportar também para o Reino Unido.

Lá, o aumento do consumo de cervejas com baixo teor ou sem álcool também vem sendo puxado pelas gerações mais jovens, diz o jornalista britânico Jeff Evans, especializado em cerveja.

“Bebedores mais jovens têm uma relação diferente com o álcool”, afirma. “Eles bebem quando estão afim, mas muitas vezes não se importam de se divertir sem álcool”

“Eles também estão mais ligados à indústria de cervejas artesanais, marcada pela experimentação e pelo foco no sabor. Junte as duas coisas e a combinação é o que estamos vendo hoje: uma expansão do setor de bebidas de baixo teor alcoólico ou álcool zero.”

A isso ele acrescenta ainda o fato de que as cervejarias têm cada vez mais conseguido desenvolver métodos de fabricação que preservam o sabor da bebida sem álcool e criar bebidas que são uma “excelente alternativa” às tradicionais.

A participação das cervejas sem álcool no Brasil ainda é pequena, mas o mercado também tem assistido à chegada de novos rótulos em paralelo ao crescimento das cervejarias artesanais – que saltaram de 70 para 700 no país nos últimos 10 anos, de acordo com a Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva).

Fonte: Época Negócios

 

 

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